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quinta-feira, 22 de maio de 2014

Há quem diga




Há quem diga que o nosso amor foi como o mar
com infinitos horizontes onde nos deitávamos
cingidos por sua fala salina
com marinas em torno de tudo
que nos dizia respeito

Há quem diga
que foi o mar que nos gerou
quando pisávamos incautos
os seus tornozelos de água


Há quem diga que foi com o mar
que aprendemos a nos afagar
e  a entoar com suas canções
de roda
a oração que nos
fez navegantes

Há quem diga que foi o mar
o nosso mensageiro

E todos os poemas são traduções
de suas águas e  veleiros





quarta-feira, 21 de maio de 2014

Escultor de palavras

Escrever versos é esculpir palavras
Nada que as mãos do Outono
não desfaçam
Escrever versos
é esculpir na pedra
até que o mármore
da palavra
nasça 

segunda-feira, 19 de maio de 2014

Horizontes



Eu estava só
e as plantas cresciam
sob o alísio
Eu namorava a alma
das estrelas vagas
sob a febre da noite
e das águas

Eu estava só
assistindo à grande queda
do horizonte
sobre a claridade

das calçadas

domingo, 18 de maio de 2014

Arrastão





Recolho do mar
os poemas
para que assim
renasçam
com seus motivos
de vento

Que importa se me trazem
a exaustão das estradas
ou os sudários esquecidos
dos habitantes do frio

Que importa se me trazem
a pele franzida e aguada
do escalpo de uma estrela
caída da madrugada

Nos anzóis do dia-a-dia
fisgo os poemas
que emergem
da foz  de um mundo
não feito

E há sempre uma safra nova
com seus motivos e vinhos

Caminho por meus poemas
pois são estradas de vento
Caminho pelo que são
passagem para a imensidão





quinta-feira, 15 de maio de 2014

magico canhoto


Quem sabe das noites do mar
que viajam invisíveis
nas dunas brandas do dia?
Quem sabe do transe
que nos fazia navegar
por entre as vidas marítimas?
      Quem é o mágico canhoto
      que promove os desencontros
      Quem sabe das coisas do mar?
      das coisas que acontecem
      entre um homem e uma mulher
      Quem é essa mulher
que recosta as mãos no meu
ombro
e meu olhar de escombros
brilha ?


quarta-feira, 14 de maio de 2014

Ônibus 614




A noite por dentro das horas e do amor
e os rostos deitados no chão do mundo
Assim caminhava-se:
milhões de cigarras na pele das calçadas
e as pedras suadas
e o cheiro de rio de mata e silêncio
e eu sem saber navegar
e sem saber do mar
e o ônibus 614 levando os meninos e meninas
com seus destinos de vento

Nada mais se sabe desta terra
nem do rosto dos seus encantados
estacionados nas madrugadas
de um mundo sem fusos-horários



Éramos filhos da noite
e havia os balões e seus caçadores
pela madrugada
e o espírito da mata com seus sonhadores
e os dias com seus mares abertos
onde o ônibus 614 passou
percorrendo  vinte quadras
antes de embrenhar-se no mundo
e descer pelos ralos do nada

Éramos filhos da terra

E a noite nos recriava
Um rio atravessau o mundo
sob a chuva que se estendeu por cem horas
entre pedras, caminhões, estrelas mortas
Tudo desceu pelo dedo das horas
naquela vida assombrada
em que para nascer era preciso
descer no ônibus 614
em um mundo sem palavras
em pleno estado de comunhão

Não estava escrito nos braços
dos navegantes
nem no navio que nos fez sair
do silencio
Não estava escrito no passado
onde nos vimos todos
nos mesmos bares e verbos
imunes ao tempo e seu  cenário
enquanto o ônibus 614
atravessava o mundo
levando os meninos e meninas
com seus destinos de vento



O ônibus 614 desceu a  Rocha Miranda
e viu Cristina Maria, feita de adolescência
e passou por dentro do tempo
entre as árvores desencontradas da esperança
pela experiência de ser guiado por uma estrela
que também por nós se guiava
pelos corredores azuis da noite
com o mapa do mar no bolso
com o mapa das águas no coração
Mínimos meninos
pisando nos trilhos de um trem que ia da alegria
a Itaguaí
mas que foi desativado
como foram oceanos
bichos, palavras, amores, amigos
lutas, violões, ventanias


Uma definição





O POETA É UMA AFRONTA À RELAÇÃO CUSTO-BENEFÍCIO

                (Ricardo Silvestrin)


segunda-feira, 12 de maio de 2014

No coração da matéria




Quebro a máquina de janeiro
no coração mudo da matéria
pisando estrelas e vísceras abertas
Sigo sem destino
fingindo ter destino
com a alma talhada por pedras
Mas a sombra de um menino me acompanha
diz-me ser eu mesmo antes de mim
Digo-lhe da morte das baleias e ele ri
Acendemos incensos pela noite
acudindo vaga-lumes descuidados
que agonizam no chão áspero da terra
Criamos com a areia do mar a fórmula
de salvar o mundo
usando serragem de estrelas
mas tudo é um sonho
Ele deita o rosto no meu peito assolado
por uma poesia sem dono
e diz ouvir os navios da infância
pergunta-me quem foi Gepeto
pergunta-me o que é o cansaço
pergunta-me sobre sua mãe e seu pai
sobre todos os movimentos dos barcos
que vê e me mostra no horizonte
onde eu
cego pelo hábito de viver incrédulo
não vejo o que sei que lá se encontra

sábado, 10 de maio de 2014

Só o deserto

Só o deserto
meu amor
sabe do meu amor
por você
Nem a cidade
com seus bichos
largados
Nem a decisão
de sonhar ou
morrer


Só o mar
com seu tremor
diário
atrelado à voz
dos que sonham
e os peixes com as presas
do luar
sabem

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Advento do outono

                                       
       
O outono tem uma sinfonia
Vejo-o  com o olhar
dos que sonham
Para este outono nasci
mas me perdi de sua aventura
Não o acho na noite
que construí
não o acho
no advento do verbo
nem no dorso
das canções belas

Para este outono nasci
mas o perdi
no córrego das ruas
e isso deixou seqüelas
e deixou-me
o silêncio dos pescadores
que tangeu
de mim meus navios

dizem que para a lua

quinta-feira, 8 de maio de 2014

Ruidosa

Ruidosa palavra
que nunca esteve aqui
adernada em minha alma
com seus elementos
de vento

Ruidosa palavra
vinda de antigas calçadas
para o país do agora
com seus pés pisando
em águas

terça-feira, 6 de maio de 2014

Esta manhã

Esta manhã não tem um plano
fora seu outono
Esta manhã tem o visgo
de outras manhãs

Esta manhã tem o pouso
dos navios sem rosto
o chumaço das águas
e o sopro dos avisos

Esta manhã tem o caos
de uma varanda aberta
e a laje anônima
de um poema

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Movimento da tarde

Navios do mar
recostados no movimento
da tarde
Quantas vezes
contemplei seus destinos
enquanto o vento da paisagem
sobre outubro
e seus verbos
folheava as rimas
do improvável

domingo, 4 de maio de 2014

Mar alto

O mar alto
e a seca nas almas
imersa
E os latifúndios
da noite
embrulhados
nas vidas
dispersas

sábado, 3 de maio de 2014

Ausências

           

Já não te aguardo
foste levada
pelos navios
de agosto
E no ocaso
da noite
escolheste
a fúria dos
acontecimentos

Já não te aguardo
derramaram-se as palavras
E o silêncio agora é esta mesa
e o cansaço agora é esta sala

Não te aguardo
nem me aguardas



haras



E de que adiantam ausências
se com elas só faço canções
Meus poemas são os haras
dos meus sentimentos sem fala

as hastes dos poemas

Só no meu peito
-casebre das estações
perdidas-
guardei as hastes
dos poemas
arrancados

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Pescador de palavras

As vantagens de um pescador
são muitas
As juntas de seus ossos
não se cansam
de tanta imensidão
Pois este pescador
trabalha com as ruas
Sabe que a matéria
de seu arrastão
são as palavras
que se esqueceram
de acontecer