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sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Calçada das horas

Está só este homem
na calçada das horas
e não lhe passa um rio
nem seus pescadores

E de si perdeu o mapa
que lhe norteava o voo
Só na calçada divaga
como espantalho de água

Terras de ninguém



Vejo o que me parece
a gangorra das palavras
que não aconteceram
O não dito no curso
de um rio sem margens
O rigor da noite
a assombrar seus passageiros
Súditos da espera
sem preces
A andar no mundo
com seus mapas e jangadas
e bandeiras
de pátrias assoladas
que são
terras de ninguém

Escrever com dor

http://www.youtube.com/watch?v=i6Ak9S5_94k


Vídeo de Constança Freitas e Francisco Orban, com um poema de sua autoria

Veleiros




Na densa noite
os veleiros
moviam-se
por alguma saga
Dentro da noite
moviam-se pelo cais
de alguma ilha
Ilhados dentro da ventania
os veleiros, em seus celeiros
de água
rangiam
como náufragos
de si mesmos
enquanto o mar
os afogava
ao relento


quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Constatações

         
Não fomos jovens
e não mais seremos
Mas um dia foi Janeiro
nos braços brandos do vento
Um dia fomos rios
Nos vagos ramos do tempo
Não fomos jovens

e não mais seremos
e que destino poderá
isto mudar?

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Laje da madrugada



Na laje da madrugada
cumpro o poema
roto feito minha vida
perpassada por tantos caminhos
E das calçadas da alma
o poema luta para nascer
não feito ente mas um ser de asas
e muitas madrugadas
por percorrer

Na laje da noite esculpo o poema
cáustico feito eu que o habito


E com o poema
tenho de novo
a procuração dos navios
a rota de janeiro
e o gosto de renascer



Navios



O caminho da extinção não dispensa os navios,
que neste mundo coabitam com os homens.
Com seus conveses largados
No mar alto do abandono

O corpo de um navio quando morre torna-se
a resina salina de um sonho
E com seu  tombadilho adernado vaga
no assoalho do nada velejando

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Escultor de palavras



Nunca mais voltei à infância
e sua comunhão com as águas
onde me plantava para ouvir
o ventre da madrugada

Guardei as mãos de meu pai
que me levavam aos circos
Depois não mais as achei
nem os circos que faziam
me sentir menino e rei

A vida é rio sem hora
com seus ventos e estrelas
mas sempre levamos dela
o que dela não desbota 

A vida é uma cadeia
da qual só se sai sem volta
mas sempre guardamos dela
o que dela incendeia

Saí do destino do tempo
como um menino de vento
mas o sentido do tempo
não me foi dado por horas
pois  seu absinto lento
só me chegou muito tarde
quando  já não pisava o chão
mas as terras da poesia
com sua música e pão

Viver  me fez me cumprir
pois fui escultor de palavras
Da infância trouxe o visgo
e a levo  para toda parte
em minha memória de circos

Assim como as mãos de meu pai
que  alfaiate de almas
que me deu um terno cinza
com  mangas de madrugadas
mais  Carlitos que bom moço
mais menino que senhor
mais sonhador que doutor

E esse terno me cabe
e com ele ganho estradas
que não são feitas de pedras
mas da voragem de asas



Signos

Sujeitos/advérbios

Signos de ar
de noite desato
versos
que fogem
para o luar

andam pelo telhado
zombam das minhas
metáforas

esses sujeitos
advérbios
adjetivos ingratos
na voz do tempo
se encontram

mas quando os busco
me escapam


segunda-feira, 25 de novembro de 2013

O poema de amor



Muitos poetas te amaram
mas eu te amei muito mais
porque estavas
no coração selvagem das estações
do mundo
e as amarras que nos apartavam
sob o teu olhar desatavam-se
e tudo era o nascimento
da encantação

Muitos outros te amaram
mas eu te amei com meu amor sereno
e pousei uma flor
na palma da tua mão
E plantei um beijo no teu sorriso
e tu cobriste de doçura com os teus gemidos
o que era o início do mundo

Muitos te amaram
mas só eu segui contigo o caminho das águas
quando meu amor louco ressoava
e fazia debandar os navios

Sol das esperanças
mar dos horizontes amarrotados de barcos
Aqui estou assolado pelas multidões de dias
e dos caminhos que encontrei pelo mundo

Ouça meu amor este poema
agora que o crepúsculo nos assedia
aceno para ti como sempre acenei
Incansável





Vantagens de um pescador



As vantagens de um pescador
são muitas
As juntas de seus ossos
não se cansam
de tanta escuridão
Pois este pescador
trabalha com as ruas
Sabe que a matéria
de seu arrastão
são as palavras
que se esqueceram
de acontecer



Pés-de-página



Caminhava sob a grande
orquestra da noite
enquanto estrelas
amenas
dos pés de páginas
dos poemas
iluminavam

seu rosto

jarros postos na manhã



Os jarros postos na manhã
improvisam os pássaros
os navios ao acaso
improvisam os sonhos

Eu me improvisei
encantado
ando por aí
reconhecendo em mim
um rei que sonha

As palavras me espreitam
por toda parte
os alaridos dos signos
me acompanham


sábado, 23 de novembro de 2013

ônibus 614

... O ônibus 614 desceu a rua Rocha Miranda
e viu Cristina Maria feita de adolescência
e passou por dentro do tempo
entre as árvores desencontradas da esperança
pela experiência de ser guiado por uma estrela
que também por nós se guiava
pelos corredores azuis da noite
com o mapa do mar no bolso
com o mapa das águas no coração
Mínimos meninos
pisando nos trilhos de um trem que ia da alegria
a Itaguaí
mas que foi desativado
como foram oceanos
bichos palavras amores amigos
lutas violões ventanias


sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Seca



Não havia lagos, mas o silêncio. E um latifúndio de acasos submersos. E uma estação fria, sem mapa. E a seca dos versos não escritos. Não havia tempo, mas um território de ventos e verbos. E uma pequena canoa, onde desciam pela grande noite, levando o livro das utopias breves. As que movem o mundo e se ausentam.

Migrações


                 
Aqui passaram
as grandes migrações
como do mar as aves
de seu tabuleiro azul
Do mar vi vidas de areia
revoarem sonadas
de suas províncias de águas

Do mar veio isso que nos fala
essas jangadas de vento
Dele guardo as rotas dos navios
e as redes abandonadas
dos navegadores cegos


Não te aguardo, nem me aguardas



Já não te aguardo
foste levada
pelos navios de agosto
e no ocaso da noite
escolheste
a fúria dos
acontecimentos

Já não te aguardo
derramaram-se as palavras
e o silêncio agora é esta mesa
e o cansaço agora é esta sala

Não te aguardo
nem me aguardas

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Esta manhã



Esta manhã não tem um plano
fora seu outono
Esta manhã tem o visgo
de outras manhãs

Esta manhã tem o pouso
dos navios sem rosto
o chumaço das águas
e o sopro dos avisos

Esta manhã tem o caos
de uma varanda aberta
e a laje anônima
de um poema


Relógio



Que relógio é esse
batendo às cinco da tarde
entre as folhagens do tempo
e as ramagens do nada?

É a noite que o fita
e os homens o habitam
em sua febril batida
nas avenidas das almas

É a noite que o tece
em suas horas cansadas
onde a gestão da vida
em nosso rosto se talha


terça-feira, 19 de novembro de 2013

Espreita

Espreita


Espreito este poema
denso de noite e agonia
Nele residem acesos
nacos de sabedorias

Nele sinto a antiga tessitura
da palavra  lapidada que resta
Espreito o que ficou deste poema
que guarda em seu caroço
a tez do dia

Espreito este poema
à luz do mundo
antes de acatar rígidas leis
Antes de desatá-lo
da tez da madrugada
Antes de apagar
o lampião da palavra

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Caminho da extinção



O caminho da extinção não dispensa os navios,
que neste mundo coabitam com os homens.
Com seus conveses largados
No mar alto de um abandono

O corpo de um navio quando morre torna-se
a resina salina de um sonho
E com seu  tombadilho adernado vaga

no assoalho do nada velejando

domingo, 17 de novembro de 2013

Lodo do tempo



Sim parecia o poema que eu buscava
Arrancado das vísceras da noite
encharcado de estrelas incautas
torrado no lodo do tempo
sob o vento insano do momento

sábado, 16 de novembro de 2013

Estratégia

Estratégia



Não tenho uma estratégia

para falar com mar

Para lhe contar de tanta saga

de toda a nossa esperança

Nós que habitamos

suas dunas de água

a sua imensidão azul

Enquanto seres

de  orlas não dominadas




sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Casebre das estações



Só no meu peito
- casebre das estações
perdidas -
guardei as hastes
dos poemas
arrancados

Procuração do mar



Artesão dos signos
procurador do mar
O ar e seus inquéritos
fraudados
A vida e suas alianças

frágeis

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Dessemelhança

Enquanto os pássaros
equilibram-se
nos vãos
da madrugada

Os homens
pernoitam
no nada

Canção antiga



Por muito menos guardei em mim o mar. Com as juntas dos ossos partidas, refiz-me pouco a pouco das palavras de ordem de uma canção antiga, que falava do esperar. Não sobrou muito depois. Uma vez despojado desses versos, descobri que a encantação me alimentava. Entre as hordas de um  país feito de  noite,  a encantação fora um guia não muito prático para as coisas mais próximas da realidade. 


Hoje, irmanados, nesse ônibus parador, que caminha sem nenhum mapa por um país chamado mundo, penso nesse roteiro vagabundo, do qual não guardei cópia. Lá fora, um horizonte de águas cerca e toma as últimas cidades de nossas biografias. As mesmas cidades em que um dia fomos invencíveis, quando  portávamos em nós a força do touro e a magia dos que se alimentam de transes, como uma manada de sonhadores, em harmonia com seu rebanho.

terça-feira, 12 de novembro de 2013

Que o mar cumpra seu papel


Que o mar cumpra seu papel
com seus búzios que a todo momento
me chegam com seus  sonetos de vento
(casulos empedrados pelo tempo)

Que o mar cumpra seu papel
ao trazer-me o sentido do infinito
seu país azul amarrotado
e que levo aos ouvidos desatentos

Conclusões



 

      Espero dez anos depois
em um dia qualquer
de uma primavera  perdida
ver o verde irremediável das plantas
e das minhas esperanças
Dez anos depois
        ver o mar bater enfim
        sob as trancas vedadas
Espero dez anos depois
        ver chegar  às janelas cerradas
e despovoadas desse tempo
os acenos de Carlitos
Já que  ninguém mais sabe
que as armadilhas estavam armadas
que os versos seriam
documentos apócrifos
e que tudo o que fomos seria nada
sem a poesia e sua pátria

Depois dis

                                          





segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Galhardetes



Tudo está vivo na noite
até o brilho das estrelas
que pontuam
a escuridão
como galhardetes
no céu
acalentando a lua
e ébrias 

de imensidão

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

De que são feitos?

De que são feitos esses navios
que do ofício de existir não trazem os mapas 
Descidos do mar sem fim 
para a palma das palavras?


De que me servem se não me dizem suas jornadas?

domingo, 3 de novembro de 2013

Palavras calcinadas

Velejo pelo avesso de um sonho com os apetrechos do que resta, vindo do convés de um Outono. Velejo pelo avesso dos versos e ponho sobretudos e gravatas e sob as estrelas da noite acolho palavras calcinadas.

Marina - 1975

Marina    -    1975
Não é porque dormes
Marina
dentro de um país
sitiado
que esquecerei tua luta
nem os versos itinerantes
nem os bancos das praças
onde dormíamos
porque não havia
mais endereços

não é porque caiste 
neste cotidiano das palavras
que esquecerei
do espírito do mundo
pregado na nossa pele
quando o mal era uma canção
sem versos

e o bem o silêncio ao longe

sábado, 2 de novembro de 2013

Presença de água



Porque estive em tua presença
as águas do pensamento nasceram
Porque beijei tua boca
a canoa das horas parou
Porque era o mar e o sol
sob a chuva e o vento
Porque um abismo sem palavras
apagou-se sem dor
Porque amanhecia quando tu chegaste
e uma lua gigante

pousava nos ramos da tarde

Precário destino



Há muito que o mar me trouxe
como pele suas algas
Os ventos batem afoitos
nos cascalhos do meu rosto
Movido por um deus mudo
sigo atento pelas dunas
do areal que ficou
do que um dia foi só água
Há muito que o mar me deixou
como saga seus navios
e suas escunas brancas
com as tarrafas da esperança
Das coisas do mar e do mundo
eu sou tecelão e causa
fazendo com as palavras
o que os homens fazem aos hinos
Seguindo suas calçadas
perscrutando seus caminhos
dou um sentido maior
ao meu precário destino
catando búzios do mar
como acordes espalhados
neste areal de silêncio
onde estrelas fazem

pausas

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Escultura



Escrever versos é esculpir palavras
Nada que as mãos do Outono
não desfaçam
É esculpir na pedra
até que o mármore
da palavra

nasça

Avesso de um sonho

Velejo pelo avesso de um sonho com os apetrechos do que resta, vindo do convés de um Outono. Velejo pelo avesso dos versos e ponho sobretudos e gravatas e sob as estrelas da noite acolho palavras calcinadas.


Sobrados da noite



É a noite o que nos fala
com seus sobrados
na alma
São seus trapiches
que  movem
essas cidades
de água

É a noite que nos faz viúvos
com a trilha dos sonhos
e os calos dos mudos

Somos a matéria dessa noite
e ela nos deserta e ignora