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terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Palavra




Que cais sufraga esta palavra
tão atônita em sua enseada?

Palavra minha única estrada

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Veleiros da madrugada




Se os veleiros
não nos seguirem
mais pelo mundo,
outras palavras
nomearão as coisas,
uma velha roupa de madrugadas
não terá mais sentido
e o vínculo com os sonhos
estará desfeito.

Mas o que impediria
os veleiros
de permanecer tão janeiros
em sua vigília de brancas
velas
no mar amarrotados de ventos?

sábado, 27 de dezembro de 2014

Moinhos







Reinventar-se com o mar
atenuar as pedras do caminho
moer os moinhos de vento


                          




                                            Do livro de Francisco Orban - Cesto das canções 
                                                                       com pássaros


Julia




"Julia brincabiava na tarde
quando o vento aventuou-se
em finas falhas e andarilhou
na rota de se seus pés" 


                

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Território sem chão



Esse território
não tem chão
São pontes noturnas
atravessadas nas junções 
dos ossos
onde a poesia
depois de triturar
a carne
persegue seus seguidores
pela alma adentro


Breve escultor



Por ser um sonhador
quebrei o rio das falas
onde tudo se dizia

Envolvi-me
com o grande país do nada
onde o mar das horas
navegava

Imputei à noite
as normas de outra pátria:
a poesia como saber sinfônico

Fui um breve escultor do mundo
imbuído de solidões
gráficas

Arguí silêncios
para a sós com as palavras
profaná-las

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Versos




Esses são os versos 
amarrotados
com seus signos
e trocadilhos rotos
Palavras
com que posso desarrumar
o mundo


          (Do livro de Francisco Orban-
               No País dos estaleiros) 

Na quebração



Eu andei na quebração
de um sonho
quando o mar
era um horizonte
azul

Eu andei na quebração
dos dias
quando o mundo
era nossa febre


                    (Do livro de Francisco Orban-
               No País dos estaleiros)

Madrugadas caladas




Depois disso ninguém sabia
se era noite ou dia
A manhã toda tecida
de madrugadas caladas

Um violino quebrado
fazia lembrar a lua
e a dor fugia e voltava
como uma águia sem rumo


           

Arados do tempo



Vínhamos de velhos territórios
verbos vagos nos seguiam
e as alamedas das horas
se refaziam na noite

Entre os arados do tempo
e os cães cegos da aurora
e as vozes dispersadas
dos combatentes
sem rosto


             (Do livro de Francisco Orban-
               No País dos estaleiros) 

Nascidos em Janeiros




De novo nasceremos com Janeiro
mês que já foi nossa enseada
Seu manto solar
nos vestia
suas pontes de um vento azul
abrasador nos afagava

Janeiro foi a foz
de toda estrada
O mapa para o estado
de comunhão
que  se buscava


                         (Do livro de Francisco Orban-
               No País dos estaleiros)

Ditames do mar





Com o absinto do mar
e seus ditames remo
e trajo a indumentária azul
de seus desígnios

Sob as asas e os signos 
de sua espera
trago a trama
de seu alarido


              (Do livro de Francisco Orban-
               No País dos estaleiros)

Olhar de pescador

Meu olhar 
desconhece o vento
E a cada intento do azul
escrevo um verso
Se estou perto de Deus
não sei ao certo
Aqui os flamingos
desconhecem o tempo
e planam sobre o mundo
a céu aberto

Eu voo sob os braços do eterno
em mim tão perto


                    (Do livro de Francisco Orban-
               No País dos estaleiros) 

Casca do tempo

Aqui nesta casca do tempo
com seu nódulo de horas
onde ávidos 
buscamos
a polpa escassa
do agora

Aqui nesta casca
do nada
que por hora 
habitamos



                (Do livro de Francisco Orban-
               No País dos estaleiros) 

Homem do mar

Sou um homem do mar
e por isto velejo
num navio
sem rumo

Num navio de velas
tecidas de sol
e outonos dobrados
emprestados do mundo

Sou um homem do mar
que espanta cansaços
Para acordar
e se por
a serviço das águas

                   (Do livro de Francisco Orban-
               No País dos estaleiros)




Divagações




Minha alma extenuada
por um divagar conciso
retorna aos tombadilhos
onde me invento
E seres da madrugada
tecem com seus elementos
um caminho de cigarras
aos poetas esquecidos


 (Do livro de Francisco Orban-
               No País dos estaleiros)

Trapiches

O tempo corria aberto
como um cacto sangrando
batiam hordas de vento
e em nossas vidas  andaimes 

Subíamos por seus trapiches 
como trapezistas cegos
Errantes como inquilinos
de um mundo inumano



          (Do livro de Francisco Orban-
               No País dos estaleiros)

Torniquete

Na claridade do dia
vejo sempre estas tendas
de tarde esculpidas
de onde exaurido sigo poeta
para as batalhas  perdidas

Na claridade do dia
ando nesta rua só de ida
para o amanhã que ninguém sabe
a fazer um torniquete que encobre
a sangria dos embates estelares


             (Do livro de Francisco Orban-
               No País dos estaleiros)

Marília

Então era o açude to tempo
o que ali me acenava
aqueles haras de luz
em meio a tão longos dias
onde um dia deparei-me
com o sorriso de Marília 

Onde um dia inclui-me 
na foz da sua alegria
Naquela tarde encantada
pelo que seu sorriso abria

Onde Marília de branco
tirou o branco que havia
ficando branca para mim
em sua nudez tão alva
que até hoje me encanta
o que para mim acenava




 (Do livro de Francisco Orban-
               No País dos estaleiros)

Efeito das palavras



Eu que estava só sob o efeito das palavras
quis fazer delas em mim um caminho e enseada
Agora persigo a luz que pousa na minha alma
inventando o que me escapa encanto o que me desata

Como as lanternas acesas dos balões das madrugadas
onde os silêncios dormiam entre as coisas inexatas
agora reinventados em forma de música e água




 (Do livro de Francisco Orban-
               No País dos estaleiros)

Janeiros

Que seja janeiro
de onde emergem as palavras
içadas dos parapeitos
dos dias que aqui me chegam
e se erguem para nada

Que seja janeiro
a foz do primeiro beijo
e também deste copo
a espantar-me de mim mesmo

E que de janeiro voltem
os comboios da infância
com seus navios perdidos
no dorso dos horizontes

E que assim janeiro nos deixe
sem as respostas procuradas a esmo
só encontradas nos teus olhos janeiros
e nesta enseada a que chamo de teu corpo

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Rima sem rosto

Canto a rima sem rosto
do acaso
onde degredado 
dos seus beijos
vago
Aqui, onde a noite
e um rio me tangem
e me trazem 
tua ausência
que imanta
este triste
e breve poema

Sumário

Não teve a anuência 
de dezembro
para o seu falar
improvisado
mas resgatou verbos
calados
do silêncio 

Barco sem cais

Como um barco sem cais
refaço o percurso 
que nos apartou
As ruas escorriam
pelos dias
e o mar era o nosso destino
O pão nosso de cada dia
era o nosso amor
E assim, livres
com as mãos atadas
pelo estado de comunhão
que nos supria
seguimos sem sequer
suspeitar
que o tempo
era uma armadilha

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Palavras

A noite tinge estrelas
esculpidas sobre as águas
Mas sob o clarão do nada
forjamos vagas certezas
com nossas frágeis palavras
em seus navios de areia
Que fossem nossas palavras
mas estradas do que muros
ou mesmo mais do que isto
fossem o sentido que busco
Mas são apenas os pássaros
das algazarras do mundo
pois quando as busco e as enlaço
se tornam signos mudos
e novamente me acho
sob o mistério de tudo



quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Sob estrelas

Sob as primeiras estrelas
e a égide de um sonho
descemos abismados
das cercanias do outono

E as centelhas da noite
com seu enxame de estrelas
são como acordes calados
que nos ocultam seus nomes

Sob as primeiras palavras
das cercanias das águas
trago na noite os poemas
soltos da foz do mundo

Uma definição







O POETA É UMA AFRONTA À RELAÇÃO CUSTO-BENEFÍCIO

                (Ricardo Silvestrin)

Deliberações

Decidiremos hoje
ao primeiro descuido das estrelas
se cada palavra
untada pelo mel da noite
descerá sobre os muros
iluminando o rosto de todos

Cada palavra será então
uma grande estrada 
a ser galgada

E novos sonhadores
percorrerão 
seu percurso

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

No Coração da matéria



Quebro a máquina de janeiro

no coração mudo da matéria
pisando estrelas e vísceras abertas
Sigo sem destino
fingindo ter destino
com a alma talhada como pedras
Mas a sombra de um menino me acompanha
diz-me ser eu mesmo antes de mim
Digo-lhe da morte das baleias e ele ri
Acendemos incensos pela noite
acudindo vaga-lumes descuidados
que agonizam no chão áspero da terra
Criamos com a areia do mar a fórmula
de salvar o mundo
usando serragem de estrelas
mas tudo é um sonho
Ele deita o rosto no meu peito assolado
por uma poesia sem dono
e diz ouvir os navios da infância
pergunta-me quem foi Gepeto
pergunta-me o que é o cansaço
pergunta-me sobre sua mãe e seu pai
sobre todos os movimentos dos barcos
que vê e me mostra no horizonte
onde eu
cego pelo hábito de viver incrédulo
não vejo o que sei que lá se encontra

Algazarra

Cresci dentro da algazarra
só entre pontes 
e impossíveis pactos
Impactado pelo amor
e o desamor das palavras
Só sem menos que antes
ou cercas de arame
Sereno diante do vento
da noite
a sussurrar-me o universo 
errante

Mero remador

Quisera eu
que sou um mero remador
no mundo
ter o poder de enfeitiçar
as palavras 
Elas sim, me chegam 
do nada
e se refazem plenas
renascem na palma
da emoção de um poema
Não transmuto
as palavras
desato-as
de suas ciladas

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Arrastão






Recolho do mar
os poemas
para que assim
renasçam
com seus motivos
de vento

Que importa se me trazem
a exaustão das estradas
ou os sudários esquecidos
dos habitantes do frio

Que importa se me trazem
a pele franzida e aguada
do escalpo de uma estrela
caída da madrugada

Nos anzóis do dia-a-dia
fisgo os poemas
que emergem
da foz  de um mundo
não feito

E há sempre uma safra nova
com seus motivos e vinhos

Caminho por meus poemas
pois são estradas de vento
Caminho pelo que são
passagem para a imensidão

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Ônibus 614




A noite por dentro das horas e do amor
e os rostos deitados no chão do mundo
Assim caminhava-se:
milhões de cigarras na pele das calçadas
e as pedras suadas
e o cheiro de rio de mata e silêncio
e eu sem saber navegar
e sem saber do mar
e o ônibus 614 levando os meninos e meninas
com seus destinos de vento

Nada mais se sabe desta terra
nem do rosto dos seus encantados
estacionados nas madrugadas
de um mundo sem fusos-horários



Éramos filhos da noite
e havia os balões e seus caçadores
pela madrugada
e o espírito da mata com seus sonhadores
e os dias com seus mares abertos
onde o ônibus 614 passou
percorrendo  vinte quadras
antes de embrenhar-se no mundo
e descer pelos ralos do nada

Éramos filhos da terra
E a noite nos recriava
Um rio atravessau o mundo
sob a chuva que se estendeu por cem horas
entre pedras, caminhões, estrelas mortas
Tudo desceu pelo dedo das horas
naquela vida assombrada
em que para nascer era preciso
descer no ônibus 614
em um mundo sem palavras
em pleno estado de comunhão

Não estava escrito nos braços
dos navegantes
nem no navio que nos fez sair
do silencio
Não estava escrito no passado
onde nos vimos todos
nos mesmos bares e verbos
imunes ao tempo e seu  cenário
enquanto o ônibus 614
atravessava o mundo
levando os meninos e meninas
com seus destinos de vento



O ônibus 614 desceu a  Rocha Miranda
e viu Cristina Maria, feita de adolescência
e passou por dentro do tempo
entre as árvores desencontradas da esperança
pela experiência de ser guiado por uma estrela
que também por nós se guiava
pelos corredores azuis da noite
com o mapa do mar no bolso
com o mapa das águas no coração
Mínimos meninos
pisando nos trilhos de um trem que ia da alegria
a Itaguaí
mas que foi desativado
como foram oceanos
bichos, palavras, amores, amigos
lutas, violões, ventanias

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Do mar

Do mar
os búzios
estes adereços
de água
com os quais
ouço
sua sinfonia
azul 

Os búzios 
que o mar estorna
assim como nós de sua orla
da qual não voltamos
impunes

Como do quebrar
de suas vagas
e dos abraços
de seus horizontes
abertos

terça-feira, 11 de novembro de 2014

ônibus 614

Tramo com o dia 
um poema
que se torne

passagem

Do poema ônibus 614

Tempo

O que seria o tempo
se não um breve vento
a folhear 
o que nos antecede
e o que será

Aqui



Aqui
onde o mar
se anuncia
como o prenuncio
de revoadas

Aqui onde as mãos
cansadas terão
vez

Aqui onde  tudo 
se cala
sob o teor
da madrugada


Aqui, de onde  
a noite exala
(do mar)
um país azul

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Face secreta



Lido com a face secreta do mar
Aqui as pedras secam sob o outono
A sombra de um poema fica
como saga de navegações

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Uma definição






O POETA É UMA AFRONTA À RELAÇÃO CUSTO-BENEFÍCIO

                (Ricardo Silvestrin)

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Longe das estrelas




As palavras que agora nos separam são as mesmas que um dia usamos ao andar de mãos dadas, no nascimento do mundo. Longe, longe das estrelas, aqui estamos sem mais o que dizer, já sem as palavras, que um dia foram os primeiros passos e acalantos que te encantavam e que retornavam a mim, através de teus braços.  Agora, só o áspero silêncio enlaço e ele me devolve o mesmo roteiro de estrangeiro, de onde  parto novamente para outro cais, além dos mapas náuticos, para outro cais, além dos mares e da noite e da desventura de te perder.

Horizontes




Eu estava só
e as plantas cresciam
sob o alísio 
Eu namorava a alma
das estrelas vagas
sob a febre da noite 
e das águas

Eu estava só
assistindo à grande queda
do horizonte
sobre a claridade
das calçadas

terça-feira, 4 de novembro de 2014

Resgate



Todos os cães vadios
esperam que a noite 
se entregue
E nos recupere meninos
e nos recupere moleques

Todas as noites sem versos
sofrem a sua natureza
com as canções perdidas
no bolso das velhas camisas

Todas as noites perdidas
vivem a sua profecia
sonham o seu destino
de acordarem dias

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Sexto sentido



Minha namorada
tem cabelos e silêncios
pele de porcelana morena
dilemas abertos
no seu corpo

Minha namorada
tem o sexto sentido
peitos apontados
para o meu delírio


De noite
ela pisa 
nos embriagados
distantes
da terra

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Jarros na manhã

Os jarros na manhã
improvisam os pássaros
Os navios ao acaso
improvisam os sonhos

Eu me improvisei
encantado
Ando por ai 
reconhecendo em min
um rei que sonha

Os alaridos dos signos
me acompanham

Advento do outono


                                       
       
O outono tem uma sinfonia
Vejo-o  com o olhar
dos que sonham
Para o outono nasci
mas me perdi de sua aventura
Não o acho na noite
que construí
não o acho
no advento do verbo
nem no dorso
das canções belas

Para o outono nasci
mas o perdi
no córrego das ruas
e isso deixou sequelas
e deixou-me as mãos largadas
e me trouxe o silêncio 
dos pescadores
que tangeu
de mim meus navios
dizem que para a lua

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Terraço do mar

O mar desfazia
meu texto
Com seu tumulto
a esmo
jogava a madrugada
contra mim
que amei
suas gaivotas
que planavam sem fim
pela vida
bicando 
sua sinfonia

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Jornada

Se a palavra
comporta
o oceano
porque
não fazer dela
uma jangada?


Porque não fazer
dela uma jornada
navegando
no dilúvio 
de seu sonho ?

segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Seca dos versos





Não havia lagos, mas o silêncio. E um latifúndio de acasos submersos. E uma estação fria, sem mapa. E a seca dos versos não escritos. Não havia tempo, mas um território de ventos e verbos. E uma pequena canoa onde desciam pela grande noite, levando o livro das utopias breves. As que movem o mundo e se ausentam.

Dentro de um transe



Deixaram os cavalos partir. Agora galopam sob a lua e seguem o rastro dos ventos. Vindos das águas e das ilhas, correm pela noite como dentro de um  transe. Com seus músculos em sintonia com o mundo, os cavalos não sonham as palavras dos homens. Exacerbados pelo enigma que os consome e lhes concede um tempo breve feito de  ternura e fúria.

Pernoites



E não há estação de fuga
pernoite em terras amenas
Os poemas são descuidos
nas horas secas do mundo

domingo, 19 de outubro de 2014

Esta manhã


Esta manhã não tem um plano
fora seu outono
Esta manhã tem o visgo
de outras manhãs

Esta manhã tem o pouso
dos navios sem rosto
o chumaço das águas
e o sopro dos avisos

Esta manhã tem o caos
de uma varanda aberta
e a laje anônima
de um poema

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Destino incerto



No mar amarrotado 
de navios
com seu azul a céu
aberto
eu vi dos conveses 
dos dias
um destino 
incerto

Vi o que não 
compreendeu 
o amor
vi além das marinas
e do caos

Com o enigma 
da poesia
nos anzóis
frágeis
do dia-a-dia





Do mar sem fim



De que me servem esses navios
que do ofício de existir
não trazem os mapas
descidos do mar sem fim
para a palma
das palavras?

De que me servem
se não me dizem 
suas jornadas? 

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Precário destino



 
Há muito que o mar me trouxe
como pele suas algas
Os ventos batem afoitos
nos cascalhos do rosto
Movido por um deus mudo
sigo atento pelas dunas
do areal que ficou
do que um dia foi só água
Há muito que o mar me deixou
como saga seus navios
e suas escunas brancas
com as tarrafas da esperança

Tarrafas




Nunca precisei da lua
como agora
com  sua tez clara
a gestar auroras

As redes infinitas
que arremessei
sob as estrelas
hoje são velhas
tarrafas
a resgatar
vidas 
esgarçadas

O menino de água
se foi
na curva
da quarta-feira

terça-feira, 14 de outubro de 2014

No Coração da matéria


Quebro a máquina de janeiro

no coração mudo da matéria
pisando estrelas e vísceras abertas
Sigo sem destino
fingindo ter destino
com a alma talhada como pedras
Mas a sombra de um menino me acompanha
diz-me ser eu mesmo antes de mim
Digo-lhe da morte das baleias e ele ri
Acendemos incensos pela noite
acudindo vaga-lumes descuidados
que agonizam no chão áspero da terra
Criamos com a areia do mar a fórmula
de salvar o mundo
usando serragem de estrelas
mas tudo é um sonho
Ele deita o rosto no meu peito assolado
por uma poesia sem dono
e diz ouvir os navios da infância
pergunta-me quem foi Gepeto
pergunta-me o que é o cansaço
pergunta-me sobre sua mãe e seu pai
sobre todos os movimentos dos barcos
que vê e me mostra no horizonte
onde eu
cego pelo hábito de viver incrédulo
não vejo o que sei que lá se encontra

Outras horas

Estas horas
que se falam 
em mim

Que não cabem 
no que sinto
porque jazem
fora do que sou

Andam à deriva
do que vivo
na estrada silenciosa
do tempo

Onde navegam
outas horas
que aqui falam
comigo

sábado, 11 de outubro de 2014

Aqui





Aqui
onde o mar
se anuncia
como o prenuncio
de revoadas

Aqui onde as mãos
cansadas terão
vez

Aqui onde  tudo 
se cala
sob o teor
da madrugada


Aqui, de onde  
a noite exala
(do mar)
um país azul

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Hastes dos poemas

Só no meu peito
-casebre das estações
perdidas-
guardei as hastes
dos poemas
arrancados

Velho outono




Velho outono ferido pelo país dos caminhos
por ti sitiei cidades e um porto abandonado
onde toda a dor escoava
Por ti vesti uma roupa de sobrados
sob as marquises de um sonho
E quando tudo exauria-se na noite
as almas dos poemas retornaram
como luas embrulhadas em um transe

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Escultura

Escrever versos
é esculpir palavras
Nada que as mãos
do outono
não desfaçam

Escrever versos
é esculpir na pedra
Até que o mármore
da palavra
nasça

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Sobrados da noite


            



É a noite o que nos fala
com seus sobrados
na alma
São seus trapiches
que  movem
essas cidades
de água

É a noite que nos faz viúvos
com a trilha dos sonhos
e os calos dos mudos

Somos a matéria dessa noite
e ela nos deserta e ignora